quinta-feira, 20 de abril de 2017

PORQUE SOU CONTRA A EXECUÇÃO (OU CUMPRIMENTO DE SENTENÇA) NOS PRÓPRIOS AUTOS

A execução (ou cumprimento de sentença) nos próprios autos, aparenta ser até "natural" e que se constitui óbvio prolongamento da ação, onde, finalisticamente, ninguém quer uma sentença, mas a satisfação do provimento obtido com ela. Será que alguém pode ser contrário a algo tão pleno da boa intenção de desburocratizar? Sim, eu posso e este breve texto é exatamente sobre a exposição de minhas razões.





Sem dúvida, tudo que vem para desburocratizar o sistema processo deve ser analisado com atenção, pois é sabido que, em todo o mundo e especialmente no nosso país, o Sistema Judiciário é taxado de moroso.
Não pretendo me delongar sobre o tema, até porque fazer isso ao ponto de exauri-lo, seria objeto de dezenas de tomos, não condizentes com a proposta de um blog e, ainda, estaria deixando de despachar e sentenciar meus processos.
A ideia da execução nos próprios autos é, como já dito no primeiro parágrafo, é boa e clara no sentido de que, se você busca uma indenização, você não quer apenas a sentença, você quer a satisfação desse direito que foi quantificado na sentença judicial. Assim, como constatado pela mudanças processuais das últimas décadas, não é "um processo novo", mas apenas um prolongamento natural do processo de conhecimento. No entanto, alguns pontos são esquecidos pela doutrina e esses me atormentam tanto na prática cotidiana que não posso deixar de decliná-los, inclusive por tópicos:

A EXECUÇÃO (OU O CUMPRIMENTO DE SENTENÇA) NOS PRÓPRIOS AUTOS É TÃO DESBUROCRATIZADORA ASSIM?

A execução nos próprios autos, inicialmente, deve ter uma petição de execução que satisfaça os requisitos processuais das petições iniciais, com a preocupação de demonstrar que a dívida exequente é líquida, certa e exigível.
Se, no processo físico, tínhamos o trabalho de tirar cópias e até algumas autenticadas, no processo virtual será absolutamente fácil capturar os arquivos necessários do processo principal, pois já estão em formato digital.
Assim, no âmbito do processo virtual - que, ao menos no Estado da Paraíba, está em todas as unidades judiciárias -, não apresenta realmente a execução nos próprios autos um "ganho" de desburocratização em ao ajuizamento em autos autônomos. Ao contrário, permite uma seleção pelo exequente do que é realmente importante para a execução, vez que documentos, precatória, mandados, audiências anteriores à sentença transitada em julgado são irrelevante na fase executória.


A EXECUÇÃO NOS PRÓPRIOS AUTOS GERA (OU PODE GERAR) PERDA DE DADOS

No processo virtual ou eletrônico, se A entra com uma ação contra B e esta (B) ganha e vai ser o exequente, enquanto que a parte faz uma simples petição, não sabe que o juiz deverá determinar a mudança de classe processual (nos termos da Resolução nº 46/2007 do CNJ) para Cumprimento de Sentença.
Até este ponto, tanto em processos virtuais como físicos, já pode ser observada uma breve "perda" da história dos autos. Se pesquisarem no sistema de controle processual, qualquer que seja ele, acharão apenas esse Cumprimento de Sentença e terá que o pesquisador saber que originalmente pode ter sido qualquer outro processo. Ficando inicialmente - salvo se forem pesquisar o conteúdo dos autos - perdida a informação que aqueles autos já foram a Indenização os Alimentos ou qualquer que seja o tipo da ação que consagrou (ou não, pois pode haver improcedência com condenação em custas o autor vencido) o direito buscado. Em resumo, há a perda da informação da classe do processo, na sua origem.
No nosso exemplo e especificamente no caso do PJe, como o sistema não prevê á hipótese de citação do polo ativo do processo (veja que numa improcedência ou na procedência do pedido reconvencional ou contraposto ou do polo ativo numa ação cujo direito tem caráter dúplice quem "ganha" é quem está no polo passivo e este é que será o exequente (polo ativo) de uma execução ou cumprimento de sentença), terá o juiz que determinar a inversão dos polos, ou seja, mais uma informação pode ser perdida, a história no cadastro do processo de como eram constituídos os seus polos originariamente.
Talvez eu esteja vendo aflorar o meu lado de quem muito trabalhou, inclusive nos primórdios da informática, com base de dados e esteja sendo preciosista com os dados, mas vejo sim alguma ou muita relevância nesses dados perdidos, que desvirtuam o processo para quem não o está acompanhando ou para quem tem milhares de processos para ficar decorando os nomes e lembrar só pelos nomes envolvidos de sua história.


A EXECUÇÃO NOS PRÓPRIOS AUTOS (OU O CUMPRIMENTO DE SENTENÇA) NÃO PODE SEMPRE SER UTILIZADA (UTILIZADO)

Interessante demonstrar que, na realidade, na maioria das vezes, uma procedência de uma ação condenatória não gera um, mas dois títulos executivos, pois sabemos que a condenação em honorários, apesar de muitas vezes executado de forma "una" com o direito principal e depois dividida amigavelmente na proporção estabelecida na sentença, tem uma dupla titularidade, não se confunde o proveito da parte com o proveito do seu advogado (honorários advocatícios).
Já tive casos que o advogado entrou ao mesmo tempo com duas petições autônomas, uma do cumprimento de sentença de seus honorários e outra com o cumprimento de sentença de alimentos ou de obrigação de fazer. Notem que aqueles autos ficariam tramitando "ao mesmo tempo" com dois exequentes pedindo dois provimentos diferentes e sobre dois ritos diferentes. Isso é impossível tanto nos autos físicos e, mais ainda, nos autos virtuais.
A solução que sempre encontro, inclusive com a colaboração da grande maioria dos advogados, por notarem que minhas preocupação é meramente processual e prática, é que desistam de um dos cumprimentos de sentença e o ajuízem autonomamente.


A EXECUÇÃO NOS PRÓPRIOS AUTOS "COMPLICA" AS ESTATÍSTICAS SOBRE O JUDICIÁRIO

Especialmente no âmbito do Direito de Família, onde um processo pode ter uma fixação de alimentos para menor executado (ou cumprido) 17 anos depois sem que seja alcançado pela prescrição ou decadência que não correm contra incapazes, pode gerar o desarquivamento do processo para cumprimentos da sentença e desordenar aparentemente um "atraso" da vara ou do juízo, estará tramitando uma ação simples de muitos anos antes. Isso não é "muito bom" par o juiz que é tão fiscalizado, tem metas, etc.

Um comentário:

  1. Caro Dr. Euler,

    É um excelente ponto de vista, do qual já havia me firmado em relação à execução de alimentos em específico, por trazer todas essas peculiaridades discutidas neste texto. As outras execuções cíveis, em processos sincrônicos, poderiam cá e ali fazer-se um "remendo" para adaptar-se ao virtual.

    Embora acredite que os dois sistemas (virtual e físico) tenham suas próprias mazelas, não há nada melhor que o PJe, com todas as facilidades que esse nos coloca. O que há de errado são essas metas. Não descobriram ainda que quantidade não gera qualidade? A duração razoável do processo prevista constitucionalmente deve ser ponderada de acordo com cada região do país. E mais, segundo a realidade de cada Comarca. Mas quem sou eu pra debater estes assuntos, um simples técnico!

    Parabéns pelo texto, ilustre professor. Seu pensamento e sua prática judicante dignificam a magistratura.

    Att.

    Rau Ferreira

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