sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Decisões Pedagógicas XV - "À la" Seu Lunga


DESPACHO

Vistos, etc.
Fui conferir e não digitei em inglês, francês ou "em grego", no último despacho. Coloquei "Intime-se a representante ([Nome]) da autora para, em 30 dias, juntar aos autos a certidão de óbito da falecida e, se tiver mais herdeiros que apenas [nome da autora], que traga a autorização desses, com firma reconhecida.".
Aí vem a parte e o defensor trazendo uma certidão de inexistência de herdeiros habilitados à pensão por morte? Respeitemos o tempo da Justiça, pois, SE O SERVIÇO FOSSE BEM FEITO, deveria ter trazido o referido documento desde o início!!!
Ora, intime-se para providenciar em 15 dias, sob pena de extinção e, de logo aviso, se arquivada, não reativarei a ação.
BAYEUX, 26 de fevereiro de 2016.
Juiz(a) de Direito

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Decisões Pedagógicas XIV - Execução nos próprios autos


Vistos, etc.
Defiro a gratuidade judiciária.
Altere-se a classe dos autos para Execução de Alimentos.
Cite-se o devedor para, em 03 (três) dias, efetuar o pagamento E provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo, sob pena de prisão, de 01 a 03 meses.
De logo, sabendo da atenção do advogado da exequente,  até para os fins de correção dos dados, sugiro que não mais "ajuize ações" de execução nos próprios autos de ações já findas ou, melhor dizendo, não "peticione" o cumprimento da sentença, apesar do que sugere o art. 528 do NCPC e é permitida pela jurisprudência e doutrina.
Esta ação, por exemplo, terá que ter a sua classe alterada para Execução de Alimentos e poderá gerar que algum incauto não mais encontre o processo onde se deu a especificação do direito material.
Até "a inicial" deixa de ser a petição inicial/primeira e passa a ser a petição de execução depois da sentença... não é estranho?
Devo também lembrar que a permissibilidade era para fins de facilitar para a parte, pois não teria que tirar cópias dos docs. dos autos ou, mais antigamente, que um escrivão copiasse cada uma das letras de uma petição, mandado ou sentença, ou, no mínimo, extraísse uma carta de sentença. Na era do processo digital, basta que acesse o processo antigo no sistema e escolha os docs. que deseja, de forma simples e sem gerar repetição como já aconteceu nestes autos, pois, mesmo tendo sido proferida a sentença que estabeleceu  .
Por fim, apesar de não ser o caso deste processo, que é recente, mas quero lembrar que as metas do CNJ seriam "corrompidas", pois teríamos uma execução recente com um número de processo muito antigo, tão antigo com o tempo da obrigação judicialmente estabelecida.
Assim, aquilo que nasceu como uma tolerância do Judiciário não pode nem deve se perpetuar nesta nova realidade do processo digital.
Intime-se para ciência, inclusive que futuros ajuizamentos não serão deferidos.
BAYEUX, 25 de fevereiro de 2016.
EULER Paulo de Moura JANSEN
Juiz de Direito

quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Sentença interessante: PREVALÊNCIA (neste caso) DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA SOBRE A BIOLÓGICA

SENTENÇA

Vistos, etc.
O promovente referido no cabeçalho, devidamente representado por sua genitora, ajuizou AÇÃO INVESTIGATÒRIA DE PATERNIDADE em face dos promovidos igualmente referenciados, alegando, em síntese, que sua genitora manteve relacionamento amoroso e sexual com os dois promovidos simultaneamente, e que muito embora, um dos promovidos tenha assumido a paternidade, a dúvida ainda prevalece, pelo que pugna, pela investigação de paternidade. Juntou os docs.
Deferida a assistência judiciária e determinada a citação.
Citado (id. nº 707268), o primeiro promovido contestou o pedido, alegando que desconhece tal paternidade. Afirmou, ainda que, se relacionou pouquíssimas vezes com o a promovente e, que a mesma já possuía um relacionamento sério com o segundo promovido, tanto que o mesmo registrou a criança como sendo sua. Por fim, alegou que não possui qualquer vínculo afetivo com o menor, pelo que requer a total improcedência do pedido.
Devidamente citado, o segundo promovido, ora pai registrado do autor, não contestou a ação (id. nº 997780).
Não houve impugnação.
Em sede de audiência de conciliação, as partes concordaram em se submeter a exame de DNA, oportunidade em que o segundo promovido afirmou a intenção de manter a paternidade registral e socioafetiva, independente do resultado de paternidade.
O exame de DNA foi realizado (id. nº 1549649), declarando-se a paternidade do primeiro promovido.
Todos os presentes foram chamados para falar sobre o doc. e apenas o primeiro promovido, se pronunciou sobre ele, alegando, em suma, que, apesar da paternidade declarada, o segundo promovido pretende continuar exercendo a paternidade sócio - afetiva, pelo que pede pela total improcedência do pedido inicial.
Com vista, o representante do Ministério Público opinou pela improcedência do pedido, sob o argumento de que a paternidade socioafetiva estabelecida deveria preponderar sobre a biológica.
É o breve relatório.
Decido.
Na realidade, se trata de um caso interessante, onde muito deve ser dito e não só de elementos jurídicos.
O menor traz na inicial uma traição havida entre sua genitora e o primeiro promovido, enquanto convivia com o segundo promovido.
Apesar de legalmente estar representando os interesses do filho e ser este legalmente o autor, é óbvio que os interesses aqui discutidos são da genitora e não do menor. Sem dúvida, apesar de vivermos numa época de valores, no mínimo, estranhos, praticamente houve a admissão de um desvalor (traição) para obter o quê? O primeiro promovido, até por ter contestado, não parece interessado na paternidade e o segundo promovido, que seria expurgado dela ou, no máximo, teria apenas uma copaternidade – segundo alguns julgados que admitem a pluripaternidade. Assim, permanece uma incógnida quais os reais interesses por esta ação. No entanto, não investigarei mais isso e partirei para o deslinde jurídico.
Vê-se dos autos que o segundo promovido, até então único genitor do menor promovente mantém a intenção de permanecer como genitor, em atenção à socioafetividade e interação que tem com o menor.
Por outro lado, sem dúvida, o primeiro promovido é inarredavelmente, conforme resultado do exame de DNA inserto nos autos, o genitor biológico do menor.
Será que a realidade biológica e material prepondera juridicamente sobre a realidade emocional e imaterial?
Sem dúvida, há julgados onde é admitida a pluripaternidade ou, mais claramente, a dupla paternidade, ou seja, constar no registro de nascimento da pessoa tanto um genitor socioafetivo como um genitor biológico.
Também não pretendo adentrar na seara das questões psicológica resultantes para um menor diante de uma pluripaternidade, inclusive questionamentos não explicáveis até certa idade para seus coleguinhas, etc., ou as dificuldades práticas, como, por exemplo, encaixar dois nomes de pais numa cédula de identidade, num passaporte ou num cadastro qualquer de computador que normalmente só tem espaço para um nome.
O que importa é que casos de pluripaternidade, quando aceitas pelo Direito e pelo Poder Judiciário têm em comum a intenção do genitor socioafetivo, geralmente alguém que acolheu o filho-afetivo com sua presença e o seu amor, muitas vezes diante de um afastamento ou falecimento do genitor biológico.
No caso em tela, o genitor reconhecidamente e inquestionavelmente socioafetivo tem a intenção de permanecer na paternidade e o biológico, além de não buscá-la ab initio, não ajuizando a ação, não a deseja, tanto que pede pela improcedência da ação, sempre que é chamado a falar nos autos.
Não seria muito pior para o menor promovente, do ponto de vista psicológico, ter um genitor biológico ausente? É mais uma daqueles questões que não trataremos aqui, mas que merece estudo, talvez em casos futuros, pela psicologia.
Outro elemento é que realmente, não entendo que o vínculo biológico prepondere sobre o vínculo afetivo o ditado popular “pai é o que cria” mostra que a verdade afetiva deve preponderar sobre a verdade genética. “Genitor”, qualquer um pode ser, até um estuprador! No entanto, “pai” é algo mais, é bem mais, é muito mais que isso e não vou me deter em trazer argumentos que poderiam variar por diversos ramos do conhecimento, de sociológicos a religiosos, pois entendo que essa minha afirmação é autoevidente.
A jurisprudência já abraçou entendimento que considero perfeito e aplicável ao caso:
PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO CIVIL. ANULAÇÃO PEDIDA POR PAI BIOLÓGICO. LEGITIMIDADE ATIVA.  PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. PREPONDERÂNCIA.
1. A  paternidade biológica não tem o condão de vincular, inexoravelmente, a filiação, apesar de deter peso específico ponderável, ante o liame genético para definir questões relativa à filiação.
 2. Pressupõe, no entanto, para a sua prevalência, da concorrência de elementos imateriais que efetivamente demonstram a ação volitiva do genitor em tomar posse da condição de pai ou mãe.
3. A filiação socioafetiva, por seu turno, ainda que despida de ascendência genética, constitui uma relação de fato que deve ser reconhecida e amparada juridicamente. Isso porque a parentalidade que nasce de uma decisão espontânea, frise-se, arrimada em boa-fé, deve ter guarida no Direito de Família.
4. Nas relações familiares, o princípio da boa-fé objetiva deve ser observado e visto sob suas funções integrativas e limitadoras, traduzidas pela figura do venire contra factum proprium (proibição de comportamento contraditório), que exige coerência comportamental daqueles que buscam a tutela jurisdicional para a solução de conflitos no âmbito do Direito de Família.
5. Na hipótese, a evidente má-fé da genitora e a incúria do recorrido, que conscientemente deixou de agir para tornar pública sua condição de pai biológico e, quiçá, buscar a construção da necessária paternidade socioafetiva, toma-lhes o direito de se insurgirem contra os fatos consolidados.
6. A omissão do recorrido, que contribuiu decisivamente para a perpetuação do engodo urdido pela mãe, atrai o entendimento de que a ninguém é dado alegrar a própria torpeza em seu proveito (nemo auditur propriam turpitudinem allegans) e faz fenecer a sua legitimidade para pleitear o direito de buscar a alteração no registro de nascimento de sua filha biológica.
7. Recurso especial provido.
(STJ - REsp 1087163/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª T., j. em 18/08/2011, DJe 31/08/2011).
Ex positis, atento ao que mais dos autos consta e aos princípios de Direito aplicáveis à espécie, e em harmonia com o membro do Ministério Público,
JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado na peça vestibular.
Custas não cobráveis, cf. art. 12 da Lei 1.060/50, e sem honorários, por ambas as partes representadas pela defensoria pública.
Publique-se, Registre-se e Intimem-se.
Após o trânsito em julgado, arquive-se com as cautelas legais.
Bayeux, 3 de dezembro de 2015.

Euler Paulo de Moura Jansen - Juiz de Direito